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Beneméritos da Santa Casa

Gratidão e Memória

Retratos de Beneméritos da Santa Casa da Misericórdia da Póvoa de Varzim

Investigação e textos: Fernando Souto e Sandra Araújo de Amorim

Agradecimentos: Alberto Oliveira ~ Ana Romero ~ Deolinda Carneiro (Museu Municipal da Póvoa de Varzim) ~ Gustavo Vasconcelos e Lurdes Adriano (Biblioteca Municipal Rocha Peixoto, PV) ~ Joana Leandro ~ José Carlos Marques ~ José Félix da Costa ~ Raúl Leitão ~ Ricardo Silva (União das Freguesias da Póvoa de Varzim, Beiriz e Argivai) ~ Rui Coelho (Real Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Póvoa de Varzim) ~ Rui Quintas (A Beneficente).

Apresentação

Na história das Santas Casas, importa reconhecer não só a ação social na prática das obras de misericórdia, como também o seu valiosíssimo património artístico, cultural e documental.
A Santa Casa da Misericórdia da Póvoa de Varzim (SCMPV), instituída em 23 de maio de 1756, foi afirmando a sua identidade através de benfeitores, que investindo na salvação da alma, procuravam também perpetuar a sua memória para além da morte. A atitude de beneficiar uma instituição de caridade não estava isenta de intenções. Assim, deixar bens ou dinheiro para os pobres e para as instituições de assistência era uma forma de preparar o caminho da salvação da alma, de ganhar prestígio e poder, e de perpetuar o nome para sempre.
A Misericórdia da Póvoa teve, ao longo da sua história, vários beneméritos e inúmeros legados, que muito contribuíram para a prossecução dos grandes objetivos e propósitos da instituição e, de forma mais particular, do seu hospital. Aos beneméritos cujos serviços prestados fossem considerados relevantes ou os donativos oferecidos tivessem sido avultados a Mesa Administrativa encomendava, normalmente a artistas locais, a pintura dos seus retratos, para fazerem parte da memória visual da instituição, ocupando, certamente, um lugar de grande dignidade.
A prática de retratar alguns benfeitores e de colocar os respetivos retratados numa galeria foi corrente em muitas Misericórdias. Procurava-se guardar memória e simultaneamente homenagear os que generosamente tinham dedicado a sua fortuna, ou parte dela, aos pobres. Deste modo, reforçava-se a identidade da Instituição, que se abria ao exterior, ao propagandear ações beneméritas na intenção de novos donativos.
O retrato era naturalmente uma forma de tornar públicas as benemerências recebidas, de manifestar gratidão e de guardar memória. Em concordância e complemento destes desígnios encontram-se expostas tábuas de memória de benfeitores que deixaram esmolas e legados ao hospital.
A Santa Casa da Misericórdia da Póvoa, que possui a mais numerosa galeria de pinturas e fotografias existente nas instituições do concelho, expõe os seus retratos em diferentes salas, como no museu, na sacristia da igreja, no salão da irmandade e no salão nobre.
São rostos de homens e mulheres, proprietários rurais, capitalistas, políticos, veraneantes e “brasileiros de torna viagem”… Eis, pois, razões para ver a exposição “Gratidão e Memória – Retratos de Beneméritos da Santa Casa da Misericórdia da Póvoa de Varzim”.
Só vemos aquilo para que olhamos.

Fernando Souto

OS ARTISTAS

Francisco José Resende: 1825-1893

Francisco José Resende de Vasconcelos nasceu, no Porto, a 9 de dezembro de 1825. Na Academia Portuense de Belas-Artes (APBA) estudou Desenho e Pintura Histórica. Sob influência do pintor suíço Auguste Roquemont, seu mestre, abandonou a pintura academista, aderindo aos temas populares. Do rei D. Fernando II, mecenas e colecionador de arte, recebeu elogios sobre o seu talento e a promessa de apadrinhar a sua formação no estrangeiro, o que aconteceu em 1853, com a ida para Paris. Regeu aulas de Pintura Histórica, Desenho, Modelo Vivo, Nu e Escultura, na APBA, e participou em diversos certames artísticos, no país e no estrangeiro, nomeadamente nas Exposições de Belas-Artes de Madrid e nas Exposições Universais de Paris e de Londres. Viajou pela Alemanha, França, Inglaterra, Bélgica e Itália. Da sua vasta obra, destacam-se os inúmeros retratos, nomeadamente de D. Pedro V, D. Fernando II, D. Luís I, D. Carlos, D. Maria Pia, do Marquês de Pombal, do Conde de Ferreira, de D. Antónia Adelaide Ferreira. Pintou cenas populares e quadros de costumes, que eram a sua preferência. Foi “um pintor popular e conservador, sempre fiel à pintura romântica, e que, ironicamente, apesar de não gostar de pintar retratos, o fez com muita frequência durante toda a sua carreira para encomendadores privados e instituições religiosas e públicas (Misericórdias, irmandades, escolas e Câmaras Municipais)”. Faleceu, no Porto, a 30 de novembro de 1893. Era pai da pintora Clara de Resende.
A SCMPV possui no seu acervo dois retratos pintados por F. J. Resende: o de Francisco Ribeiro de Castro e o de José Rodrigues Cristelo.

[Fonte: https://sigarra.up.pt]
Bibliografia de referência: MOURATO, António – Francisco José Resende. (1825-1893). Figura do Porto Romântico. Porto: Ed. Afrontamento. 2007.

Francisco Ribeiro de Castro. Col. SCMPV.

Lino da Costa Nilo: 1851-1912

Nascido a 23 de junho de 1851, na Póvoa de Varzim, no seio de uma família de pintores – os Fajardo. O pai, João do Rosário (1812-81), o avô, José João (c. 1777-1847) e o tio, António (n. 1827), todos de apelido Alves da Costa Fajardo, eram pintores. Os seus irmãos exerceram o mesmo ofício, distinguindo-se Matias Alves da Costa (n. 1856), pai de Manuel Alves da Costa (1880-1960), que ficou conhecido por “Manuel Pintor” (assinava “A. Costa”). Casou, em 1875, com D. Antónia Felicidade da Nova e tiveram seis filhos (entre os quais o Pe. Américo da Costa Nilo).
Após o casamento, o casal instalou-se na então rua da Bandeira, mudando-se depois para a rua da Junqueira e, mais tarde, para a rua Santos Minho, n.º 48, onde Lino viria a falecer, em 1912. Na década de 1880, teve uma ampla intervenção na Igreja da N.ª S.ª da Lapa, que passou pelas pinturas do farol e do templo, das imagens e elaboração da tela que fecha a tribuna da capela-mor.
Ao longo da sua vida, executou diversas pinturas a óleo, sobre tela ou madeira, bem como ornamentos decorativos em estuques de tetos e paredes, e realizou ainda trabalhos de dourador e pintor de imagens. Esteve ligado à criação do ensino secundário na Póvoa, em 1878, tendo sido docente na Escola Minerva.
Da sua vasta obra, destacam-se os retratos do herói poveiro “Cego do Maio” (1817-1884), de corpo inteiro e em tamanho natural, que se exibe no Salão Nobre dos Paços do Concelho, e do regedor da Comarca Francisco de Almada e Mendonça (1757-1804), ambos pintados a óleo, no ano de 1887. É também uma obra de referência o retrato do casal Francisco Gonçalves Amorim (“Miroma”) e D. Júlia A. Martins, da coleção de A Beneficente.
Foi um hábil pintor de retratos, trabalhando afincadamente para instituições que pretendiam dar visibilidade aos seus beneméritos, entre as quais a Misericórdia e A Beneficente.
Lino abandonou o depreciativo apelido Fajardo, substituindo-o por NILO, que é o anagrama do seu nome próprio.

Gonçalo Artur da Cruz: 1856-1928

Natural de Vila Nova de Famalicão, nasceu a 28 de junho de 1856, sendo filho do dr. Gaspar Joaquim da Cruz, bacharel em direito, que à data exercia nessa vila o cargo de Administrador do Concelho, e de sua mulher D. Maria Cândida da Cruz.
Com formação escolar na Academia Portuense de Belas-Artes, entre os anos de 1873 e 1880, distinguiu-se como estudante brilhante e dedicado do curso de arquitetura civil. Do seu percurso académico consta também a formação em pintura histórica e desenho histórico, a frequência de três anos de escultura e a realização de exame nas disciplinas de perspetiva, projeção e anatomia.

Aos 24 anos iniciou a sua carreia profissional. Desempenhou o cargo de empregado técnico nas Câmaras de Valpaços e de Mirandela e esteve ligado à construção de lanços do caminho de ferro. Em 1886, casou com D. Ana da Conceição Novais, de quem teve cinco filhos.
A chegada à Póvoa ocorreu em 1894, para ocupar o lugar de arquiteto na Câmara Municipal, ofício que desempenhou ininterruptamente até falecer, a 30 de novembro de 1928, na rua Almirante Reis, onde residia. A sua atividade ao serviço do município foi bastante intensa, deixando um elevado volume de propostas desenhadas, pois contam-se 340 projetos produzidos entre 1895 e 1928.

Elaborou, em 1901, a primeira planta geral da Póvoa. Arquiteto distinto e muito competente, entre obras públicas e particulares, contribuiu decisivamente para a criação da imagem da Póvoa de inícios do século XX.
Talentoso artista, o seu traço não se esgotou em projetos para edifícios, dado que também fez notáveis desenhos à pena e pintou retratos e paisagens.

Avelino Barros: 1879-1929

A 20 de fevereiro de 1879 nascia, na Póvoa, Avelino, filho do fotógrafo António José de Barros, que, em 1874, fundou a Photographia Barros, a primeira casa de fotografia da vila, sita na rua da Junqueira. Seguindo a profissão do pai, Avelino desde cedo demonstrou um enorme interesse e aptidão para a fotografia. Também a irmã, Felicidade Barros, casada com Francisco Ferreira Marques, abriu em 1885 a Nova Phographia Barros.

Como prova do seu valor e talento, Avelino viu reconhecidos a nível nacional e internacional – nas exposições de Paris, Nice, Lyon, Turim e St. Louis – os seus trabalhos fotográficos, obtendo inúmeros prémios e distinções, colocando-se entre os maiores e mais inovadores fotógrafos do seu tempo. O rei D. Carlos foi um grande admirador do seu trabalho, tendo-o nomeado “Fotógrafo da Casa Real”, em 1902. Fez notáveis fotografias, mas também pinturas e desenhos e foi um extraordinário gravador fotoquímico; os seus trabalhos em platinotipia, técnica fotoquímica de grande nitidez e perfeição, com recurso a sais de platina, contribuíram para reforçar a sua distinção.

Exerceu ainda cargos públicos, ligados à administração local, e teve uma significativa atividade na imprensa, com a publicação de artísticos trabalhos fotográficos e textos. Foi casado com Alice Alvares da Costa e faleceu, com 49 anos, a 27 de janeiro de 1929, na sua casa, na rua Santos Minho.

Obras Expostas

José Francisco da Silva Nunes – Barão da Silva Nunes
1852, Póvoa de Varzim – 1929, Póvoa de Varzim
Emigrante em Porto Alegre, Brasil; presidente honorário da Sociedade Portuguesa de Beneficência de Porto Alegre; diretor do Banco do Comércio de P. A; vice-cônsul português. Capitalista. Deixou um legado de 5000$00 ao Asilo da Misericórdia.
Avelino Barros. 1916.

D. Matilde Paranhos Nunes – Baronesa da Silva Nunes
?, Porto Alegre (Brasil) – 1923, Póvoa de Varzim
Casada com o Barão da Silva Nunes.
Avelino Barros. 1916.

D. Antónia Martins Moreira
1840, Póvoa de Varzim – 1915, Póvoa de Varzim
Casada com o João Rodrigues Cristelo. Deixou “ao hospital desta vila, administrado pela Irmandade da Mizericordia, e ao Asilo, administrado pela mesma Irmandade, trezentos escudos a cada um”.
Avelino Barros. 1916.

Comendador Francisco Damásio de Sousa Oliveira
1853, Porto – 1917, Póvoa de Varzim
Importante negociante de pescado, foi agraciado com a Comenda de Mérito Industrial. Foi juiz da Confraria do Santíssimo Sacramento, vice-provedor da Santa Casa (1892-94), vereador da Câmara Municipal e presidente da Associação Comercial. Proprietário. Deixou um legado de 500$00 ao Hospital.
Avelino Barros. 1918.

1771, Rates, Póvoa de Varzim – 1837, Baía (Brasil)
Comerciante na cidade de Salvador, na Baía, onde faleceu; legou “gratuitamente” ao Hospital da Santa Casa da Misericórdia a quantia de 15563$851 réis.
Autor: não assinado.

Rev.º Bernardo de Sousa Guerra
1788, Póvoa de Varzim – 1833, Lisboa
Emigrou para o Brasil onde exerceu o cargo de vigário na freguesia de Santana, na Ilha Grande (Rio de Janeiro), a partir do ano de 1815. Ao Hospital da Misericórdia da sua terra natal deixou “gratuitamente” a quantia de 200$000 réis.
Autor: não assinado.

José Rodrigues Cristelo
1840, Póvoa de Varzim – [anterior a 1888], Brasil
Emigrante no Brasil, onde faleceu, legou, em 1888, ao Hospital da Misericórdia 1705$175 réis, “sem onus”.
Francisco José Resende. 1889.

Emiliano José Pereira Azurar
1831, Porto – 1878, Lisboa
Emigrou para o Brasil, tal como os irmãos António, Tomás e Francisco. Casou em Niterói e faleceu em Lisboa. Capitalista. Foi benemérito da Santa Casa da Misericórdia.
Lino da Costa Nilo. 1888.

Francisco Domingues da Nova
1819, Póvoa de Varzim – 1896, Póvoa de Varzim
Casado com D. Maria da Nova Monteiro. Negociante no Rio de Janeiro. Sócio fundador da Associação Comercial, proprietário. Após a morte da sua mulher, os seus bens ficarão para o “hospital d’esta villa, a quem tudo deixo para fundação e sustento do asylo de inválidos do trabalho”.
Lino da Costa Nilo. 1890.

D. Maria da Nova Monteiro
1842, Póvoa de Varzim – 1926, Póvoa de Varzim
Casada com Francisco Domingues da Nova. Cumprindo a vontade do marido, os seus bens ficaram para o “hospital d’esta villa, a quem tudo deixo para fundação e sustento do asylo de inválidos do trabalho”.
Lino da Costa Nilo. 1890.

João António de Sousa Flores
?, Vila do Conde – 1881, Porto
Legou ao Hospital da Póvoa a quantia de 6000$000 réis, destinada ao pagamento de uma parteira para assistir, gratuitamente, as mulheres pobres da vila.
Lino da Costa Nilo. s/ data.

José Caetano Calafate
1810, Póvoa de Varzim – 1881, Póvoa de Varzim
Abastado comerciante de pescado. Foi provedor da Santa Casa (1856-57 e 1866-68), presidente da Câmara (1858-59), vereador e administrador do concelho. Deixou ao Hospital um legado de 10000$000 réis para a criação de um Asilo para pobres.
Lino da Costa Nilo. s/ data.

António Francisco dos Santos Graça – “Graça Brasileiro”
1852, Póvoa de Varzim – 1918, Póvoa de Varzim
Esteve emigrado no Brasil, onde trabalhou na área do comércio. Foi vice-presidente do primeiro executivo camarário republicano, sócio da Associação Comercial e grande benemérito das instituições locais. Legou ao Hospital 5000$00 e ao Asilo 2000$00.
Gonçalo Artur da Cruz. 1919.

Manuel João Gomes d’Amorim, “Bonito”
1878, Recife (Brasil) – 1939, Póvoa de Varzim
Da família dos “Bonitos de Amorim”, ficou conhecido por Mandú, foi um riquíssimo capitalista e um homem de cultura cosmopolita. Foi provedor (1929-31) e grande benemérito da Santa Casa.
Gonçalo Artur da Cruz. 1919.

Dr. David José Alves
1866, Póvoa de Varzim – 1924, Póvoa de Varzim
Foi deputado da nação, presidente da Câmara, administrador do concelho; presidente da Liga Naval Portuguesa e da Associação dos Bombeiros Voluntários. Abastado capitalista, cavaleiro da Ordem de Cristo, chefe local do Partido Regenerador, foi provedor (1905-07) e grande benemérito da Santa Casa.
Gonçalo Artur da Cruz. 1919.

Padre António Gonçalves de Oliveira
1860, Argivai, Póvoa de Varzim – 1911, Porto
Foi pároco na freguesia de Argivai e provedor da Santa Casa (1900), tendo instituído “por seu único e universal herdeiro de tudo que apparecer à hora da sua morte, o Asylo do Hospital” da Misericórdia.
Gonçalo Artur da Cruz. 1911.

Ezequiel da Silva Guimarães
?, Malta, Vila do Conde – 1917, Póvoa de Varzim
Sócio da firma comercial “Ezequiel da Silva Guimarães & C.ª”, do Porto, era frequentador assíduo da praia de banhos da Póvoa. Abastado capitalista, legou ao Hospital da Misericórdia 1000$00.
Gonçalo Artur da Cruz. 1908 (?).

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